terça-feira, 24 de novembro de 2009

Seleção: o momento crítico da “administração de RH” – o papel da “sorte”



Uma piada geralmente é composta de situações extremas e absurdas; mas só achamos engraçado se a história tiver algum fundo de realidade. Sobre “seleção de pessoal”, conta-se que uma grande empresa contratou uma assessoria para fazer uma pré-seleção a um cargo de supervisão, analisando currículos e entrevistando candidatos. Dez candidatos foram pré-selecionados para a avaliação pelo gerente geral; quando este, responsável final pela escolha, chega à sala de reunião e espalha os dez currículos sobre a mesa; fecha os olhos; pega um currículo, totalmente ao acaso e diz: vamos contratar este. Atônitos, os membros da assessoria exigem uma explicação. O gerente geral diz, simplesmente: já chega de azarados nessa empresa – dessa vez escolhi um sortudo.
Não vamos discutir o que alguns chamam de “sorte” ou de “azar” e que eu prefiro chamar de “acaso”. O acaso tem um papel fundamental para o candidato a um emprego ou a um cargo – seja ele em uma organização empresarial ou política. O “sortudo” da estória acima certamente terá muito o que comemorar. Primeiro, porque se por um lado a sua “sorte” foi determinante para a escolha do seu currículo, por outro não contou muito para que o seu currículo estivesse lá. O fato de estar lá, tendo sido avaliado e selecionado pela equipe cuidadosa de assessores certamente tem pouco a ver com “sorte”.
Por outro lado, o gerente geral, não confiou tanto na sua “sorte”, ao escolher um entre os vários currículos; na realidade, ele confiou muito na equipe que selecionou os currículos: ou seja, qualquer um dos que ele escolhesse teria uma boa probabilidade de ser uma boa opção – porque já tinham sido racional e metodologicamente avaliados por seus assessores.
Ainda assim, o efeito do acaso sempre tem algum papel. Um papel que pode ser maior ou menor, dependendo de inúmeras variáveis – mas nunca pequeno a ponto de não precisar ser considerado.
É preciso que o escolhido para o cargo não esqueça disso: não se pode negar o seu mérito em estar ali; como não se pode negar que chegar ali é algo que não dependeu exclusivamente dele, de seu esforço – por maior que tenha sido.
Assim como é preciso que o gerente geral não esqueça disso: tê-lo escolhido por acaso não significa que não mereça estar ali, que tenha sido simplesmente “sorte”. Assim como não se pode negar que o gerente não simplesmente teve a sorte de escolher um candidato à altura do cargo – afinal, foi ele que escolheu sua equipe de assessores para fazer a pré-seleção dos candidatos, o que resultou em currículos já acima de um nível mínimo.
Resumidamente, escolher “sortudos” a partir de um grupo pré-selecionado apenas admite um pouco de efeito do acaso em um processo em grande parte já previamente determinado.

M.S.

quinta-feira, 12 de novembro de 2009

Motivação: é possível motivar pessoas ou apenas estimulá-las?

Esta é mais uma ideia pretensiosa da “administração de RH”: a de que é possível motivar pessoas a fazerem o que deve ser feito. As pessoas já trazem a sua motivação consigo. É possível – e necessário – apenas reconhecer o que as motiva. Ainda, é possível reconhecer a intensidade da motivação e quais suas fontes principais.

Mais que isso, só uma coisa é possível – justamente o que as pessoas confundem com “motivação”: canalizar a motivação já existente para os objetivos da empresa. De que forma seria possível “canalizar” a motivação de alguém? Ai é que entram os estímulos. Assim, se estimula para canalizar a motivação, não para motivar.

Quando o estímulo é algum tipo de recompensa financeira, é ainda mais comum confundir estímulo com motivação – diz-se que o funcionário age motivado pela possibilidade de recompensa, enquanto ele age apenas estimulado por essa possibilidade. Os economistas dizem o mesmo de forma parecida: as pessoas reagem a “incentivos financeiros”.

Qual seria a importância de discutirmos essa aparente pequena diferença (entre motivar ou estimular)? Simplesmente por que o resultado pode ser completamente diferente, se não diferenciarmos bem uma coisa da outra. Pode-se gastar muito em “incentivos financeiros”, tentando motivar pessoas desmotivadas; assim como pode-se desperdiçar uma grande dose de motivação já disponível, por não sabermos canalizá-la adequadamente.

Ou seja, por que é necessário ir um pouco mais fundo na avaliação, antes de decidir “onde alocar um recurso humano” – ou seja, antes de destinar cada pessoa para cada tarefa. “Avaliar o perfil” de alguém, por mais detalhadamente que seja, ainda é muito pouco; por que “perfis” se referem a populações, não a indivíduos especificamente – e quem vai desempenhar a tarefa é um individuo, especificamente.

Assim, é necessário mais que conhecer o perfil de uma pessoa, é necessário conhecer a pessoa. Conhecer o perfil é suficiente apenas para concluir que a pessoa tem os atributos necessários para o bom desempenho na tarefa. Mas para tentar motivar, para estimular, para canalizar a motivação, é necessário conhecer mais que o perfil.

Conhecer a pessoa, além do perfil do funcionário, obviamente não significa saber detalhes de sua vida pessoal. Nem mesmo gastar algum tempo para definir “como você a vê”. Ao invés (ou além) disso avaliar “como a pessoa vê a si própria”. Apenas após esse passo, pode-se passar para os passos seguintes, comentados abaixo.

- Avaliar como ela vê a empresa;

- pelo menos estimar o que ela realmente deseja para si – quais são os seus projetos pessoais (o trabalho apenas serve para viabilizá-los de alguma forma, direta ou indiretamente);

- avaliar se seus objetivos pessoais estão em conflito ou em ressonância com os da empresa;

- e, finalmente, avaliar como a empresa pode servir aos objetivos pessoais do colaborador.

É, você leu correto: “avaliar como a empresa pode servir aos objetivos pessoais do colaborador” – foi o que escrevi. Quer dizer que a empresa serviria “aos objetivos pessoais dos colaboradores”? E o administrador ainda teria que ocupar seu tempo em descobrir “como a empresa pode servir para eles”?

“Conhecer tão a fundo” cada colaborador, apenas para descobrir “como a empresa pode servir aos seus objetivos pessoais”, poderia ser apenas mais uma bobagem. Acontece, porém, que as a forma mais óbvia e pragmática – a de “Incentivos financeiros” (ou seja, uma grana a mais, sempre seja bem-vinda para os funcionários), funciona dentro de limites estreitos, muitas vezes (a maioria, até?), sem o retorno desejado pela empresa. A alternativa que resta é: tratar de forma geral (por perfis) quem tem potencial médio e individualizar a abordagem daqueles que tem potencial maior.

A abordagem geral das motivações na empresa poderia ser descrita, em linhas gerais, em três segmentos:

Colaboradores que atuam nas linhas de frente têm na necessidade de sobreviver a sua maior motivação – a importância do emprego se origina daí. Mas, mesmo nas linhas de frente, nunca é apenas isso. Pois à necessidade de meramente sobreviver, se segue o desejo de “mais que sobreviver”: a princípio, “sobreviver com segurança”; a seguir, “sobreviver com conforto”.

Colaboradores que atuam em linhas de gerência, geralmente consideram que sua sobrevivência está relativamente assegurada; sentem-se menos dependentes da empresa e a importância relativa do emprego se torna menor – uma vez que acreditam que não será tão difícil sobreviver fora daquela empresa (seja em outro emprego, seja de forma autônoma). Assim, tem na necessidade de segurança e – cada vez mais – no desejo de conforto, suas maiores motivações. A sensação de estar “fazendo parte” ou até “contribuindo” para “algo maior” que o trabalho individual já se torna mais presente. Assim como as sensações de “controle” e de “poder” – o prazer advindo destas sensações é mais uma fonte de motivação. E, como todos os colaboradores são seres humanos, assim como a necessidade de sobreviver com segurança é seguida do desejo de sobreviver com conforto, este é seguido do desejo de sobreviver com “excessos”.

Colaboradores que atuam em linhas que requerem mais liderança que gerência estão presente em empresas maiores, com organogramas de vários segmentos. Estes já sobrevivem com segurança e conforto (alguns também com excessos). O que podem desejar, então, que venha a servir de motivação? Mais ainda, de motivação que possa ser canalizada pela empresa para os seus objetivos?

Há ainda um outro tipo de motivação, completamente diferente de qualquer outro. Um tipo que não tem origem nas circunstancias atuais de cada indivíduo e sim em sua história pessoal. A história pessoal de cada ser humano apresenta uma trajetória, a qual depende de três fatores: suas capacidades (o que suas características pessoais possibilitam obter); os objetivos (o que, subjetivamente, desejam obter); e suas possibilidades (o que suas circunstâncias lhe possibilitam obter). Comparando a trajetória de sua história pessoal com seus objetivos, os seres percebem se atingiram ou não o que desejam. Em seguida, reagem a essa percepção, e “frustram-se” ou “realizam-se” (esse processo será descrito em outros posts e textos).

A empresa pode ter um papel fundamental em relação a esse processo, em três momentos: 1 – ao fornecer parte das possibilidades (circunstâncias); 2 – quando o líder reconhecer as capacidades e tenta aproveitá-las em benefício mútuo (do colaborador e da empresa); 3 – ao fazer parte das realizações ou das frustrações (bem como da racionalização ou sublimação.

A motivação de um tipo especial, a que nos referimos acima, decorre da necessidade de os colaboradores, seres humanos que são, lidarem com suas realizações ou frustrações. E eles podem fazê-lo de duas formas: racionalizando ou sublimando.

Ao líder cabe avaliar os colaboradores quanto a esse processo e responder 2 perguntas: 1 – o ser humano colaborador está utilizando a empresa para sua frustração, para realização – e consequente racionalização ou sublimação; 2 – caso afirmativo, como aproveitar esse fato, canalizando a motivação resultante aos objetivos da empresa.

E quanto ao colaborador-mor da empresa, o empresário, seja ele o proprietário ou “apenas”o controlador? O que pode motivar o colaborador que está no segmento colocado mais acima nos organogramas? O que o motivou a construir é o mesmo que hoje o motiva a manter e a expandir o mais possível, a sua empresa? Se ele criou a empresa a partir do zero, deve ter passado pela fase de motivação relacionada a necessidade de sobreviver, seguida da necessidade de segurança e da possibilidade de sobreviver com excessos. Certamente já experimentou a sensação de controle de algum grau de poder. Daí pra diante, o que ainda por vir? Quais seriam as motivações ainda possíveis a quem já andou a estrada desde o seu inicio e foi mais longe do que qualquer outro, dentro da mesma empresa?

Proporei respostas a essas perguntas em outros posts. Por ora, utilizamos as perguntas apenas para deixar claro o que afirmamos no inicio: motivação, cada pessoa traz a sua; ao empresário, cabe apenas reconhecer e estimular adequadamente os colaboradores, canalizando as motivações já existentes aos objetivos da empresa, através de estímulos.

Espero que você esteja se perguntando agora: e quais seriam os possíveis estímulos? de que forma canalizar as motivações? Estas e outras perguntas relacionadas também serão abordadas em outros posts. Se você estiver se fazendo estas e outras perguntas, me permito concluir que as apresentações estão valendo a pena.

Marcus Sabry

domingo, 25 de outubro de 2009

Seleção: o momento crucial da “administração” de RH.

Uma da idéias mais pretenciosas da administração é a “Administração de RH”. Simplesmente, ninguém “administra” seres humanos. Por mais que nós possamos demiti-los sem alguma “justa causa” prevista nas leis, esse poder está longe de suficiente para qualquer coisa ao menos parecida com a idéia de “administração” de seres humanos, ou de “pessoal” ou, pior ainda, de “RH”. A idéia de que esse poder, junto com a possibilidade de oferecer e de cortar incentivos seria suficiente é uma ilusão – como a maioria das ilusões, doce e sedutora.

Treinamentos, incentivos financeiros, benefícios sociais, homenagens ao “funcionário do mês”, não deixam de ter seus efeitos, é claro. E o poder de demitir a qualquer momento não deixa de ser um argumento forte. Mas que só funcionam para pessoas de desempenho inferior ou médio. Pessoas que dão as contribuições mais significativas para as empresas não são estimuladas por incentivos nem se sentem ameaçadas pela possibilidade de demissão. Pelo menos não o suficiente para alguma diferença maior em seu comportamento dentro da empresa – a não ser, é claro, a decisão de sair daquela empresa para uma outra ou para abrir a sua própria.

Como, então pelo menos aproximar-se de “administrar RH”, uma vez que diariamente tomamos decisões com implicações sobre o “pessoal”? Como pelo menos prever os efeitos das decisões? Como preparar-se para as reações dos seres humanos que dividem algumas horas no ambiente artificial da empresa?

O primeiro passo é admitir que não são “administrados”, apenas selecionados, treinados, estimulados, avaliados, recompensados e mantidos ou descartados. Parece muito? Mas nada disso implica em que o funcionário fará o que você precisa que ele faça.

O segundo passo é admitir que cada ser humano é único. Por mais romântico que possa parecer, é isso mesmo: a estímulos semelhantes, cada um reage de uma forma própria, particular. Embora 95% das vezes seja igual, nunca se sabe de antemão quem reagirá como os 95% e quem reagirá como os 5%.

O terceiro passo é admitir que a reação externalizada corresponde ao esforço do funcionário de convencê-lo de algo – o que ele acha que você espera da reação dele. Obviamente, não manifesta necessariamente a sua reação real, interna. É apenas o que ele tenta fazer parecer que aceitou. E o que “ele tenta fazer parecer que aceitou” pode dizer muito sobre sua reação real. No entanto, é necessário que você o conheça individualmente para fazer essa interpretação corretamente.

O quarto passo é admitir que, independentemente de qualquer coisa, o que interessa é o resultado. Preocupe-se, portanto, de medi-lo continuamente, de várias formas, e compará-las de pontos de vista diferentes. Geralmente não importa muito se alguém lhe admira ou lhe odeia, desde que produza; e, é claro, um eventual ressentimento não se transforme em tentativas reais de atingi-lo.

Acho que já situamos o bastante o tema central de hoje: a seleção como o momento crucial da “administração” de seres humanos na empresa. O processo seletivo se complementa com o processo “depurativo”: ou seja, após “selecionar” as melhores promessas, é necessário manter as que se concretizam e afastar as que continuam como promessas. Não apenas para a estabilidade da empresa: também como reconhecimento àqueles que cumprem suas promessas (todos precisam perceber que você percebe claramente os que sempre deixam pra cumprir suas promessas amanhã).

O processo “depurativo” pode seguir índices de desempenho – afinal, como colocado no “quarto passo” acima, o que interessa é o resultado – o que o torna infinitamente mais simples que o processo seletivo.

Selecionar significa perceber que tem maiores probabilidades de cumprir suas funções – ou a promessa de bom desempenho. Isso é mais arte que ciência; é uma habilidade a ser desenvolvida dia-a-dia, caso a caso; é necessário guardar cada avaliação na memória para poder comparar com o resultado – que só virá semanas, meses ou anos depois. Algo que requer um elevado grau de consciência para que receba a atenção e o esforço necessários.

Porque afirmamos que selecionar é “o momento crucial da ‘administração’ de RH”? Porque selecionar a pessoa adequada para a função e para o ambiente da função é como começar um jogo ganhando e com um bom time: ou seja, a tendência é consolidar a vitória e aumentar o placar. Enquanto selecionar inadequadamente significa começar perdendo, jogando com um time ruim, em que os jogadores jogam mal; além disso, nunca chegarão a formar um sistema, um grupo que se auto-regula. Ou seja, a tendência é continuar perdendo e cada vez mais feio.

Bom, acho que você já está suficientemente convencido da importância da seleção. A questão agora é “só” saber como fazê-lo. Como já disse, seria mais arte que ciência e uma habilidade a ser buscada e desenvolvida individualmente, caso a caso. No entanto, algumas sugestões talvez possam ajudá-lo no processo.

Primeiro, defina a função claramente. A partir da função, defina o perfil que o atenderá.

Segundo, analisar o currículo (formação e experiências anteriores) e a apresentação (aparência geral, postura e modo de falar) está longe de ser suficiente; mas são etapas necessárias, fundamentais, sem as quais não adiantaria muito dar os próximos passos – muito mais abstratos e relativamente difíceis.

Terceiro, você tem 5 a 10 minutos para conseguir “ver por trás da máscara” – algo que os psicólogos podem requerer sessões e mais sessões de 45 minutos. Quem é a pessoa que está tentando conseguir um crachá da sua empresa? O que ela realmente quer? E o que ela realmente pode fazer – de produtivo e de destrutivo? Que meios estaria disposta a usar para atingir seus objetivos – ou seja, quais são os seus limites: morais, legais ou racionais?

Outras perguntas, talvez ainda mais difíceis de responder em 10 minutos, mas progressivamente mais importantes à medida em que aumenta a complexidade da função e o grau de dependência da empresa em relação ao funcionário:

1. Como essa pessoa pensa? Que lógica ela usa em suas decisões? Uma lógica predominantemente científica, racional ou a-racional?

2. O que a motiva? O desejo de produtividade máxima ou o desejo de compensar alguma frustração através do trabalho e, consequentemente, da empresa?

3. O que ela deseja: apenas sobreviver com segurança e algum conforto ou deseja sobreviver com excesso? Ou desejaria “mais que sobreviver”?

4. Quais seus padrões predominantes de comportamento e de relacionamento: com subordinados, com semelhantes e com superiores?

5. Enfim, a promessa é de ser: 1) líder – predominantemente construtivo ou predominantemente destrutivo; 2) liderado – predominantemente construtivo ou predominantemente destrutivo?

Perguntas fundamentais para sabermos como lidar com cada pessoa. Ou seja, como estimulá-la com boas probabilidades de se obter o necessário (o mais próximo que podemos chegar de ‘administrá-la’); como avaliar seu grau de satisfação e de ressentimento com a empresa – e assim seus possíveis efeitos no médio prazo.

Assim, o primeiro determinante dos resultados da empresa é a seleção de potenciais colaboradores e sua avaliação contínua. Buscar responder às perguntas acima pode ser um bom começo para a arte de selecionar.

M.S.